
Foto Crédito Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA (CDC)/Unsplash
As evidências científicas no campo da saúde estão longe da realidade e a Organização Mundial da Saúde (OMS) pretende reduzir essa distância. Nesse sentido, a organização acaba de divulgar uma orientação técnica que visa padronizar a condução e a supervisão de ensaios clínicos em todo o mundo. Pela primeira vez, a OMS oferece recomendações para autoridades nacionais de saúde, autoridades regulatórias, financiadores e outros agentes envolvidos com o tema a fim de que melhorem os ensaios clínicos gerando evidências mais seguras e confiáveis. O documento aborda desafios como design de ensaio ruim, diversidade limitada de participantes, infraestrutura insuficiente e ineficiências burocráticas, que custam tempo, dinheiro e vidas. A diretriz abrange ensaios para qualquer intervenção de saúde, incluindo (mas não se limitando a) medicamentos farmacêuticos, vacinas, diagnósticos, medidas nutricionais, intervenções cognitivas, comportamentais e psicológicas, cuidados preventivos, abordagens digitais e de saúde pública, além de medidas tradicionais com o emprego de ervas, por exemplo.
De acordo com o documento, a divisão entre países de alta renda e países de média e baixa rendas está levando a sérias desigualdades nos ensaios clínicos. Em 2022, por exemplo, 86 países de alta renda realizaram 27.133 ensaios, enquanto que o total em 131 países de média e baixa rendas era de 24.791. Em certas ocasiões, os países de menor renda foram incluídos em ensaios clínicos realizados pelos países de alta renda, mas apenas para que conseguissem autorização dos órgãos reguladores em seus países.
Outro dado importante. Naquele mesmo ano, menos de 5% dos ensaios clínicos incluíram mulheres grávidas e apenas 13% incluíram crianças. Isso reduziu a qualidade das evidências, afetando o atendimento e o acesso às intervenções. Para a OMS, a ausência de testes adequados em populações sub-representadas pode levar a uma abordagem cautelosa no tratamento delas, o que impacta negativamente sua saúde. Além disso, essa lacuna na representação também pode deixar as pessoas desses grupos menos dispostas a aceitar recomendações de saúde.
Por isso, a orientação hoje divulgada inclui considerações práticas para a criação de ensaios que incluam mulheres grávidas e lactantes, uma vez que elas têm necessidades únicas de assistência médica. O documento também observa que populações em risco devem ser envolvidas desde os estágios iniciais. Para facilitar, a segurança deve ser avaliada como uma prioridade inicial, por exemplo, revisando intervenções comparáveis ou agilizando estudos pré-clínicos para esses grupos. Procedimentos apropriados para consentimento e assentimento são essenciais, particularmente para crianças.
A orientação ainda recomenda colocar o paciente, o participante e a comunidade no centro da organização de ensaios clínicos, para garantir que o planejamento, a execução e a disseminação da pesquisa atendam às necessidades do público e mantenham a confiança.
A nova diretriz também busca fortalecer os ecossistemas nacionais de pesquisa e desenvolvimento por meio de financiamento sustentável, para apoiar uma melhor tomada de decisões, acelerar o acesso à inovação em saúde e construir ambientes de pesquisa em saúde nacionais e globais mais robustos e eficazes.
Ao lançar a orientação, Jeremy Farrar, cientista chefe da OMS, destacou que “fortalecer a pesquisa e o desenvolvimento liderados pelos países e incorporar ensaios clínicos em serviços clínicos de rotina e de saúde pública garantirão acesso mais rápido e equitativo a intervenções seguras e eficazes, ajudando as pessoas a se tornarem mais saudáveis”. E concluiu: “esta nova orientação visa melhorar a diversidade de participantes de ensaios para garantir que a pesquisa beneficie a mais ampla gama de pessoas possível, afastando-se decisivamente de uma abordagem única para todos”.